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A saga de ler nos transportes públicos.

Quem nos segue já há algum tempo, sabe que as minhas maratonas de leitura decorrem habitualmente a bordo de algum transporte público, nas muitas e constantes deslocações que me vejo obrigada a fazer no dia a dia. O que ninguém sabe é que é em parte por causa dos transportes públicos que eu comecei a ler.
Na verdade, hoje em dia é um hábito mantido por falta de tempo em outras horas do meu dia. No entanto, com 7 anos de idade, o desejo tinha um motivo diferente. 

Os livros sempre chamaram por mim, tal como continuam a fazê-lo na actualidade. A minha mãe diz que eu antes de aprender, chorava no alto dos meus cinco anos por não conseguir sozinha descobrir as histórias maravilhosas por detrás da conjunção de consoantes e vogais, e que nem sempre tinham paciência para mas ler. Depois, já na escola primária, aprendi em dois meses o que muitos demoram a conseguir durante um ano inteiro, tal a minha ânsia.

O que é que isso tem a ver com transportes? Nada directamente, mas foi um comboio que me fez procurar por livros com menos desenhos e com ares de "mais crescida". Das poucas vezes que me vi obrigada em deslocar-me para o trabalho da minha mãe, ela levava sempre um livro com ela. Quando olhava em redor, uma outros viajantes faziam o mesmo e iam sempre compenetrados nas leituras. Para mim, ler naquela altura passava pela assertividade de me assumir como alguém mais adulto e bem comportado, e de querer ser igual a todas aquelas pessoas bem arranjadas e com portes que achava altivos e seguros. Por esse motivo, comecei a arrastar o primeiro livro de "Os Cinco" comigo, e apesar de ter demorado um ano para completá-lo, fiquei fascinada com as possibilidades de novos livros. Por esse motivo, nunca mais parei.

Ler nos transportes é algo que passei a fazer assiduamente, a partir do momento em que anos mais tarde retornei ao mundo autónomo dos transportes públicos. O que certamente já me trouxe uma série de situações caricatas e típicas de um amante de livros, e que julgo que todos se poderão facilmente identificar.

Em primeiro lugar, há que descortinar que circulo por vários modos de transporte, sendo que uns facilitam mais a leitura que outros. Não que isso me impeça. Não é a primeira vez que perco um autocarro porque estou tão embrenhada no livro sentada na paragem que nem dou por ele passar. É aliás, nos autocarros, que evito ler de todo, a não ser que o destino seja o terminal, ou já sei que o resultado não será muito proveitoso. Ou estou sempre com medo de perder a paragem de saída, ou arrisco-me a que isso mesmo aconteça. E tenha de pagar a multa posterior.
Nunca aconteceu porque os motoristas sempre se mostraram afáveis, mas se puder evitar uma crise, fá-lo-ei.


Depois, por outro lado, o metro é aquele modo de transporte onde raramente se espera ver pessoas a ler. Errado. Não é nada raro entrar numa carruagem e ter imensas pessoas a lerem espalhadas por todo o lado: sentadas, de pé, junto das portas, a segurarem-se, a não segurarem-se...Ou a sairem de uma carruagem e continuarem a subir as escadas para a saída sem largarem o livro. Eu própria já o fiz uma vez ou duas. E pode ser complicado mas quando estamos muito embrenhados não é a necessidade de sair num determinado sítio que nos faz parar. Por vezes, já fui pela linha que dá pelo caminho mais longo só para prolongar a minha leitura mais uns 10 minutos.

No fundo, ter uma vida demasiado ocupada exige-nos algumas soluções inteligentes, onde possamos aproveitar o nosso tempo de forma inteligente, e não deixar para trás os pequenos prazeres do dia a dia.

Mas voltando a situações caricatas, quantas vezes é que se cruzaram com alguém a ler algum livro que vocês querem muito ler (e querem perguntar a opinião da pessoa) ou que já leram (e lhe querem dar o vosso incentivo)? Eu passo por isso várias vezes e até há pouco tempo tinha receio de incomodar as pessoas. Claro que se elas vão muito concentradas, não vou importuná-las, mas aqui há uns tempos comecei a fazê-lo. Pelo menos se o livro me interessa muito e estou curiosa para saber se vale a pena adquiri-lo. E até hoje as pessoas com quem me cruzei e o fiz acharam piada e na maioria das vezes acabámos por falar durante mais uns 5 minutos sobre livros e outras questões. E passo a vida a divulgar os grupos de trocas onde estou, o que já trouxe muito mais pessoas para os grupos (e tornei algumas viciadas!).

Depois, uma nova tendência são os rapazes. Não falo de homens a ler porque isso sempre foi habitual. Mas adolescentes a ler, por vezes até romances tipicamente definidos como tendo como público-alvo as mulheres, começam a ser vistos espalhados um pouco por todo o lado. É bastante interessante e revigorante também. Parece que se perdeu uma certa vergonha e estereótipo sobre leituras, que agora se fazem cada vez mais fora de quatro paredes.

 

 Por outro lado, ainda acaba por ser mais giro quando vamos a ler o volume de uma saga e alguém à nossa frente/sentado ao lado a ler exactamente a mesma saga, às vezes um antes outras um depois. Ou um livro que acabou de sair e encontramos mais alguém a lê-lo, e o desejo perguntar "Em que parte é que vais??".

Eu já passei por todas estas situações e mais alguma, que vocês nem poderão imaginar. Partilhar o vício pelos livros é bom, seja lá onde for. E ainda mais quando estamos perante uma convenção não declarada de pessoas que também gostam de ler. Os transportes públicos provaram-nos isso. E provarão durante o resto da semana que aí começa.

Cláudia
Sobre a autora:
 
Maratonista de bibliotecas e bookcrossing, a Cláudia ainda consegue estudar e fazer o seu mestrado enquanto lê nos transportes públicos. Defensora da sustentabilidade e do voluntariado é tão fácil encontrá-la numa biblioteca como na Rota Jovem em Cascais. É uma sonhadora e gosta de boas histórias, procurando-as em cada experiência que vive.

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